(ANSA) - Por Lucas Rizzi - O desafio de lidar com a perda gestacional é tema de um curta-metragem brasileiro de animação em realidade virtual que está em cartaz no br/brasil/noticias/cultura/2024/08/24/brasil-mostra-forca-com-presenca-robusta-no-festival-de-veneza_584b808b-b29b-402d-8da9-0f44da7e65dc.html" target="_blank" rel="noopener">Festival de Veneza, mostra de cinema mais antiga do mundo, mas que tenta se manter atual com uma seleção dedicada inteiramente a obras imersivas.
"40 Dias Sem o Sol", criado pelo artista visual João Carlos Furia, surgiu de uma experiência pessoal dolorosa: a perda de um filho em gestação, luto muitas vezes negligenciado no Brasil, mas que atinge dezenas de milhares de famílias no país todos os anos.
"Minha primeira ideia era fazer um livro infantil. Quando comecei a lidar com a questão e ver que tinha pouco material sobre o assunto, uma das minhas vontades era explicar para minha filha o que tinha acontecido, porque ela perdeu o irmãozinho dela também", conta Furia, que nunca havia feito um trabalho autoral antes, em entrevista à ANSA.
No entanto, ao amadurecer sua própria relação com a perda, ocorrida em plena pandemia de Covid-19, o artista percebeu que uma mídia física poderia ser limitada, o que o levou para a realidade virtual em animação, formato ideal para uma história com movimento, música e até um toque de magia.
"Mas mantive alguns aspectos da ideia inicial e usei na estética um estilo que lembra os livros infantis e os próprios traços de uma criança. A animação é feita como se fosse um livro pop-up", diz.
Na obra, um casal - João e Daniele - e sua filha, Bianca, passam 40 dias trancados na escuridão de casa após um aborto espontâneo impedir a chegada do menino Matheus ao mundo. Durante esse período, que também remete ao isolamento vivido na pandemia, a família precisa aprender a lidar com o luto antes de voltar a ver o sol. "Quantos medos já vencidos até que meus olhos pudessem enxergar", diz uma das canções do curta.
"Tive essa vontade de honrar e homenagear nossa própria história e fazer com que ela pudesse ser vista por outras pessoas com leveza, poesia e beleza. Não é algo para ficar escondido. Ao cuidar da minha própria dor, também estou cuidando da dor de outras pessoas", afirma o artista, acrescentando que o luto causado por abortos espontâneos é um sentimento "desvalorizado" no Brasil.
A inclusão na seleção "Veneza Imersiva" pegou Furia de surpresa, uma vez que o trabalho já tinha estreado no festival Raindance Immersive, em Londres, em outubro de 2023. A obra foi indicada ao Festival de Veneza por Ryan Genji, produtor da gigante da internet Meta (dona de WhatsApp, Facebook e Instagram) e que, segundo o artista brasileiro, ficou "muito tocado" ao ver a animação.
"Nem passava pela minha cabeça [ser selecionado para o Festival de Veneza], é o maior reconhecimento do mundo em realidade virtual", diz. O convite chegou tão em cima da hora que Furia sequer teve tempo de planejar uma viagem à Itália e acompanha a repercussão do filme à distância, mas ele espera que a participação na mostra possa abrir novos caminhos.
"Eu não estou procurando construir algo em cima disso, mas é um passinho a mais em alguma jornada desconhecida na qual eu gostaria de embarcar", conta.
A seção "Veneza Imersiva" reúne 63 projetos de realidade estendida de 25 países, e "40 Dias Sem o Sol" é exibido na seleção "Melhores Experiências - Fora de Concurso", ou seja, sem disputar premiações. (ANSA).
Brasileiro leva luto de abortos espontâneos ao Festival de Veneza
Perda gestacional é tema do curta em RV '40 Dias Sem o Sol'