(ANSA) - Comentários do ex-premiê da Itália Silvio Berlusconi sobre a invasão da Rússia à Ucrânia criaram uma saia justa para a líder de extrema direita Giorgia Meloni, que deve tomar posse como primeira-ministra na semana que vem.
Amigo de longa data do presidente Vladimir Putin, Berlusconi disse na última terça-feira (18) a deputados de seu partido, o conservador Força Itália (FI), que havia "retomado relações" com o líder russo, com quem teria inclusive trocado bebidas alcóolicas e "cartas muito doces".
Inicialmente, aliados do ex-premiê tentaram desmentir as declarações, mas a agência de notícias LaPresse divulgou um áudio comprovando o teor da fala de Berlusconi.
Além disso, a agência revelou novas gravações nesta quarta-feira (19), ampliando o constrangimento para Meloni, que promete manter o apoio à Ucrânia contra a invasão russa.
"Eu não vejo como se possa colocar Putin e Zelensky em uma mesa de mediação. Zelensky, na minha opinião... Deixa para lá, não posso dizer...", afirma Berlusconi em um dos áudios, indicando um tom crítico ao presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky.
Em outra gravação, o ex-premiê explica aos deputados sua versão para a guerra russo-ucraniana, que se mostra alinhada ao discurso do Kremlin.
Segundo Berlusconi, Zelensky "triplicou os ataques" contra as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk após ter chegado ao poder, e as duas regiões separatistas, "desesperadas", enviaram delegações a Moscou para pedir ajuda a Putin.
Ainda de acordo com Berlusconi, o presidente russo teria inicialmente resistido a tomar alguma atitude, mas sofreu uma "forte pressão de toda a Rússia e decidiu inventar uma operação especial".
Segundo o ex-premiê, as tropas russas deveriam chegar em Kiev em uma semana, depor o governo e impor uma gestão de pessoas de bem e de bom senso", mas encontraram uma "resistência imprevisível" graças às armas enviadas pelo Ocidente. "E a guerra, ao invés de ser uma operação de duas semanas, se tornou uma guerra de 200 anos", disse.
A reconstrução é semelhante a uma versão dada pelo próprio Berlusconi três dias antes das eleições parlamentares de 25 de setembro, vencidas pela coalizão liderada por Meloni e da qual o ex-premiê faz parte.
Na ocasião, o posicionamento de Berlusconi provocou duras críticas do governo ucraniano, que pediu que os italianos escolhessem candidatos "com princípios morais corretos".
Ambiguidade
Às vésperas de assumir o poder na terceira economia da zona do euro e em um dos países fundadores da União Europeia, Meloni tem tentado se vender no cenário internacional como uma líder moderada e responsável, que vai manter o alinhamento a Bruxelas e à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).
No entanto, a futura premiê já é alvo de cobranças devido às posições pró-Rússia de seus dois principais aliados: o FI, partido de Berlusconi, e a Liga, de Matteo Salvini, que é contra as sanções do Ocidente a Moscou.
"As declarações de Berlusconi são gravíssimas e incompatíveis com o posicionamento da Itália e da Europa. O governo Meloni está nascendo sob o sinal da pior ambiguidade", afirmou o ex-premiê Enrico Letta, líder da centro-esquerda italiana.
Além disso, um indicado por Berlusconi, o ex-presidente do Parlamento Europeu Antonio Tajani, deve ocupar o Ministério das Relações Exteriores na nova gestão.
"As palavras de Berlusconi confirmam que o Força Itália não é um partido confiável e está claramente ao lado da Rússia. Tajani não pode se tornar ministro das Relações Exteriores", criticou o líder do partido de centro Ação, Carlo Calenda.
Já Francesco Lollobrigida, líder do Irmãos da Itália (FdI), partido de Meloni, na Câmara, garantiu que o país continuará ao lado do povo ucraniano e "em defesa da democracia". "Sobre aquilo que diz respeito a declarações de outros, vocês devem perguntar aos outros", minimizou. (ANSA)
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